sexta-feira, 7 de maio de 2010

SpaceBlooks: a primeira noite


O combinado era chegar às 18:00hs para acertarmos o que falar, mas já sabia que seria impossível. Acabei aparecendo meia hora depois e dei com uma Blooks em plena atividade. Falei com Elisa Ventura, dona da livraria, que me apontou a mesa onde se encontravam meu colega Toinho Castro e os convidados Bráulio Tavares, escritor, músico e roteirista, e Eduardo Sousa Lima, jornalista e cineasta também conhecido como Zé José. Presentes à mesa as namoradas de Toinho e Zé, que, vítimas de minha indelicadeza contumaz, acabaram não sendo apresentadas ao povo que foi chegando sorrateiro. Primeiro Luis Felipe Vasques, que demonstrou sua verve tradicional, depois Rafael Luppi, grande Lupo, meu colega e editor no site Hyperfan, que sempre que possível marca presença mesmo em eventos improváveis como minha defesa de mestrado, em 2002.

O bate papo na mesa estava tão bom que perigamos perder a hora do evento. Como eu previa, necas do César Coelho aparecer. Afinal, o cara vinha de uma ponte aérea e, de acordo com minha experiência, essas coisas são imprevisíveis e insuportáveis. Cheguei a afirmar ao Toinho que o esperava por volta de 20:30hs, mas que tinha certeza que viria, já que, quando fui responsável pela SDesign, evento de design em Vitória, o animador e co-criador do Anima Mundi não decepcionou. Às 19:15hs, eu e Toinho decidimos dar início aos trabalhos com o Bráulio e o Zé José. Havia ainda um quarto convidado, o crítico Rodrigo Fonseca, que ligou avisando que não poderia comparecer, mas isso não me intimidou, pois sabia que podia contar com a destreza do Bráulio para abrir um evento desses.

Foi quando percebi as presenças da historiadora, escritora e multimulher Ana Cristina Rodrigues, que participará da próxima mesa, no dia 13, e de Ricardo França, escritor bissexto e grande figura da Ficção Científica Brasileira. Os dois, juntamente ao Lupo e ao Felipe, mais tarde acrescidos do escritor e quadrinista Patati, formaram o núcleo da FCB durante toda a noite. Também presente o escritor Rafael Lima, autor de Aura de Asiris, um romance de Techno-Fantasy, segundo ele. Fiz uma pequena piada a respeito da profusão de subgêneros na literatura fantástica, mas o Rafael explicou que não haveria outra maneira de classificar sua obra e eu acatei antes de me dirigir à mesa.

Apresentei Toinho à platéia e ele, em resposta, me apresentou, convidando os visitantes incidentais que estavam por ali olhando livros a se acomodarem. A platéia rapidamente se estabilizou por volta das 30 pessoas, com acréscimos ocasionais. Logo o Bráulio assumiu o microfone, deliberando com muita propriedade sobre as diferenças de construção e concepção da ficção científica no cinema e na literatura, tema que perpassaria toda a noite em diversos momentos. No meio da fala inicial do Bráulio, chegou César Coelho, esbaforido, mas com o sorriso onipresente. A mesa, afinal, estava de acordo com o que havíamos imaginado.

Zé José herdou o microfone e discorreu sobre sua visão de uma ficção científica que é voltada para o futuro, mas pensa o presente, exemplificando com a série clássica de Star Trek. Zé também discorreu sobre os percalços de seus projetos pessoais.

César levantou diversas provocações, citando Arthur Clarke e Riddley Scott, afirmando que a ficção científica é o discurso preferido da maioria dos animadores iniciantes, incluindo a si próprio, cujo primeiro curta foi sobre um supercomputador tornado deus por uma tribo perdida. Acrescentou que a tecnologia contemporânea, apesar de facilitar uma inserção no mercado de animação, muitas vezes banaliza o resultado dos projetos.

Pegando a trilha da tecnologia, Bráulio postulou que o grande salto da ficção científica não foi a nave espacial e sim o celular e Eduardo Lima apontou as diferenças entre um futuro esperado/projetado e um presente que mantém semelhanças com a idéia de futuro de antigamente, mas que é introjectado, voltado, por assim dizer, ao innerspace.

Aberta a sessão para o público, um rapaz arriscou com uma pergunta sobre computação e tecnologia que vai e volta. César respondeu bem falando sobre a eventual incapacidade de um autor em visualizar o futuro e citou Alien, de Riddley Scott, que exibia computadores de bordo com telas de fósforo nos monitores.

Dei vazão a uma vontade que Bráulio e César comparassem seus trabalhos de criação em Hoje é Dia de Maria e O Romance da Pedra do Reino. Para se ter noção, o assunto foi até Tim Burton, fez uma curva acentuada, falou-se sobre Avatar e, mais uma vez, descambou para as questões de produção, o que foi ótimo. Toinho citou Farenheit 451, de Ray Bradbury e François Truffaut, e discorreu sobre a versão cinematográfica e a situação constrangedora de não existir uma boa mostra dos livros que, muitas vezes, servem de base para essas super (ou nem tão super assim) produções.

Rafael Lima aproveitou a deixa e perguntou o que os debatedres achavam da nova safra de escritores de gênero. Bráulio, sempre um gentleman, desviou da conversa e não respondeu diretamente, preferindo falar sobre William Gibson.

Finalizando, uma moça da platéia apontou a facilidade de lidar com desenhos japoneses apesar de seu imaginário potencialmente estranho ao público ocidental. Foi quando Bráulio soltou a segunda melhor frase do dia, afirmando que considerava o surgimento de criatividade na televisão um evento próximo ao milagre de Fátima, quando as crianças viram a virgem Maria. Era algo desejável, mas que parecia raro e distante.

Findas as questões, houve o sorteio de um livro de Philip K. Dick para alguém da platéia. O vencedor foi o número 24, o que gerou a melhor frase da noite (e piada imediata), por Luis Felipe: “o 24 levou Dick”. Ao som das gagalhadas, terminou a primeira noite do evento SpaceBlooks, que prometeu novas palestras, novas civilizações, audaciosamente indo aonde muita gente nunca pensou que poderia viajar

7 comentários:

Luiz Felipe Vasques disse...

"Pegando a trilha da tecnologia, Bráulio postulou que o grande salto da ficção científica não foi a nave espacial e sim o celular"

Curiosamente, o Phil Plait, do BadAstronomer.com observou que na semana que o presidente Obama anunciou o retorno da viagem à Marte, as pessoas estavam muito mais interessadas no lançamento dum gadget ligeiramente superior ao que elas já haviam comprado logo antes. "Since when science has become something so inwards?", ele acrescenta. Pois...

Fabio Fernandes disse...

Excelente relato, Octavio! Meus parabéns mais uma vez pela bolação e pela curadoria do evento, que já desde o primeiro encontro se tornou um enorme sucesso. Vamos torcer para que continue - e que venham mais edições!

Octavio Aragão disse...

Acredite, Fáio, foi muito melhor do que o texto deixa perceber. E o que dá ficar escrevendo como um coadjuvante de Razão, Sensibiidade e Zumbis.

Mas aguardamos sua participação na quinta que vem, certo?

Toinho Castro disse...

esse primeiro encontro do spaceblooks foi a oportunidade de começar um novo diálogo, né, octávio?
nossos convidados eram de primeira e estou entusiasmado para o próximo!
grande abraço

Octavio Aragão disse...

Pois é, Toinho, acredito que foi excelente, mas que podemos fazer mais e melhor nos próximos. Os times que virão também são de responsa.

Rafael "Lupo" Monteiro disse...

Olá, Octávio, sei lá porque só hoje li seu relato.

O primeiro dia foi muito bom, e quinta que vem estarei lá novamente!

Octavio Aragão disse...

Eeeei, Lupo! Contamos com sua presença na quinta-feira, cara.